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De esquecidas a protagonistas de uma mensagem de esperança

Ainda que tenham sofrido de várias formas nestes últimos dois anos, o papel que as crianças exerceram não foi meramente passivo.

 

“Muitas crianças participaram ativamente na defesa de uma ideia que unia a sociedade, de que vamos sair desta e que ainda vamos conseguir resolver estes problemas”, explica Manuel Sarmento. A forma como as crianças fizeram do processo de vacinação uma luta também sua, mostra-nos precisamente isso.

 

A educadora Lu relembra como os seus meninos se mostraram entusiasmados quando esta foi estendida às suas idades. “Estavam todos contentes: «Lu, já fui tomar a vacina! Agora o vírus pode-me atacar que eu tenho defesas!»”

 

Explica que o modo como percecionaram a situação foi numa perspetiva de “vamos resolver o problema, vamos fazer parte”. O sentimento de contribuição para uma causa comum encorajou o olhar dos miúdos sobre a pandemia.

 

Na escola puderam também encontrar um espaço que lhes permitia desenvolver coletivamente uma participação ativa. As atividades que realizaram em torno destas questões fê-los sentir parte da sociedade e desvendou os aspetos em que puderam ser úteis, nomeadamente ao levarem o sentimento de esperança junto daqueles que mais precisavam.

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"Quero dizer-lhe que é uma guerreira, pois luta contra o coronavírus e cuida de todos nós"

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Os alunos da professora Sofia foram desafiados a escrever uma carta encorajadora a um trabalhador da linha da frente à sua escolha. 

 

Alguns escolheram mostrar a sua admiração à profissional de saúde que sempre os acompanhou no Centro de Saúde de Moimenta da Beira. “Quero-lhe dizer que é uma guerreira, pois luta contra o coronavírus e cuida de todos nós.”, pode ler-se numa das cartas dirigidas à enfermeira Márcia.

 

Manuel Sarmento reforça que as crianças encontraram diversas maneiras para demonstrar a sua resiliência e foram portadoras da esperança. “Fizeram-no de muitas formas, por exemplo, através de cartazes que colaram nas janelas com o arco-íris e da participação nas redes sociais, onde colocaram quer por elas próprias, quer pelas suas famílias, os seus desenhos.”

Não é possível fechar os olhos aos impactos que a pandemia teve nas crianças. Ainda assim, a psicóloga Sofia Ramalho fala-nos de uma “plasticidade e de uma flexibilidade do ponto de vista do seu desenvolvimento cognitivo”, que ajuda os mais novos a fazerem esta adaptação às situações mais inesperadas.

 

Com maior facilidade do que qualquer adulto, explica que estas são capazes de se moldar a qualquer situação. “Rapidamente adaptaram-se a ter que usar máscaras e estarem isoladas, como também se adaptaram a ter que as tirar e voltar a socializar.”

Possuindo uma imaginação fértil, as crianças utilizam-na tanto para se adaptarem a novos contextos, como também para apresentarem soluções. 

 

Defensora de que os media poderiam assumir um papel mais educativo na questão da guerra, Sofia Ramalho diz-nos que esta alternativa poderia passar por “chamar as próprias crianças para darem aqui uma voz e dar contributos sobre como se pode construir a paz e, quem sabe, não surge uma forma de chegar a processos de paz”.

Uma das consequências da rápida adaptação destas crianças é a mimetização de comportamentos que observam nos adultos. No caso da guerra, isto pode ser um aspeto negativo por haver uma certa inclinação para polarizar posições. 

As brincadeiras bélicas dos intervalos expõem isso mesmo. Assentes na dicotomia entre os bons e os maus, a história do polícia e ladrão pode passar a ser protagonizada por ucranianos e russos, respetivamente. 

 

É, então, urgente uma educação para a paz. Uma educação que passe por vincar a diferença entre aquilo que é a vontade de um presidente e a vontade de um povo que “perdeu a sua liberdade de manifestação contra a guerra e de estabelecer contactos telefónicos fora da Rússia”, exemplifica a psicóloga.

“A educação para a paz significa fazer com que as crianças possam lidar com estas situações de uma forma crítica e reativa”, reforça o sociólogo “E por outro lado, permite criar nelas sentimentos e condutas de aceitação e compreensão do outro.” 

 

Um dos efeitos imediatos destes dois períodos foi que as crianças ficaram ainda mais à margem da sociedade. “Para já porque deixaram de estar na rua, de ir à escola durante os confinamentos” e depois porque “toda a atenção mediática e coletiva se concentrou nos mais idosos, por serem o grupo de risco”, diz-nos Manuel.

 

Depois de um hiato de tempo em que as crianças ficaram como que esquecidas e invisíveis, “é esta a hora de as pôr a falar e de dar visibilidade àquilo que elas fizeram, aos desenhos que construíram”, finaliza.

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